quarta-feira, 5 de março de 2008

Não perca o próximo episódio
se o houver......

- Sabes, disse-lhe, lembras-me alguém que conheci há muitos anos.
No coração dele aquela frase ressoou, bateu em quantas paredes havia daquela casa que julgava segura... Gaguejou um porquê surdo.
- O Plínio foi uma das primeiras pessoas que conheci quando cheguei à Cidade Velha. Acho que tinha, nessa altura, 18 anos. E ele tinha a mesma idade. Jovens cheios de vontades e ideias... Não sei de onde veio a cumplicidade, mas aos poucos foi-se materializando. Gostávamos de ler os mesmos livros, gostávamos de sair à noite, fazer jantaradas com amigos e depois ir dançar. Caramba, e o Plínio dançava bem! Música brasileira ou espanhola, quando me segurava pela cintura a sala perdia os contornos, esvaziava-se e éramos só nós, a música, o ritmo certo, as respirações sincronizadas... Gostava de lhe chamar "o meu terramoto", porque quando ele se aproximava as minhas estruturas vacilavam, tremiam, e eu sentia que me caíam todas as defesas. Os dias eram leves e perfeitos, se calhar como estes que vivemos agora. Mesmo antes das férias passámos a noite sozinhos, explorámos as nossas vidas, ele levou-me a casa de mão dada e despediu-se com um beijo. Estivemos dois meses sem falar (ainda não havia telemóveis...). Sim, acho que terão sido dois meses. Quando voltámos ao trabalho soube que ele tinha uma namorada nova. Fiquei triste, mas alguma coisa dentro de mim me disse que ainda não era o fim daquela história. Depois, nesse mesmo ano, conheci o Simão. Gostava dele, mas era um gostar mais calmo e sereno. O Simão fazia-me sentir segura. Bom... Talvez demais... Cercou-me por todos os lados, aparecia em minha casa sem ser convidado, interrompia o trabalho só para me dizer olá, raramente saía à noite sem tropeçar nele. Acabava sempre por me levar a casa. Finalmente cedi. A relação não durou muito. Nessa altura estava cheia de trabalho, mal comia, era um prato de sopa e uma sandes empurrada à pressa para dentro da boca. Nunca lhe dei a atenção que ele merecia, nunca me empenhei a sério no que havia entre nós. Antes do Natal, no mesmo dia em que lhe dei a prenda, acabámos. A gota de água foi o Plínio. Depois de estar sem o ver meses, apareceu-me de repente à frente no convívio de Natal do emprego, e puxou-me para dançar. O tempo nunca tinha passado entre nós... Logo que pude escapei-lhe e chorei mais do que em qualquer outro dia da minha vida quando me despedi do Simão.
As coisas acalmaram dentro de mim, nem Plínio nem Simão, só trabalho e trabalho, e umas pausas pelo meio. O Plínio ia contando as miúdas que lhe passavam nas mãos, quando estava triste ligava-me. Sentávamo-nos num nicho que há na parede da Biblioteca, lá fora, e falávamos até ser dia. Ele contava-me tudo o que havia para contar e eu fazia o mesmo. As palavras nunca acabavam entre nós...

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