terça-feira, 30 de março de 2004

Óculos escuros

Precisava de comprar uns óculos... Vou de férias, e não me apetecia ter de enfrentar o sol com os olhos nús.
É sempre mais confortável ficar atrás de umas lentes escuras.

Decidi pedir-te ajuda. Sabia que ia ficar baralhada, mas mesmo assim pedi.

Ultimamente tenho tentado abrir um pouco mais os meus horizontes, e não me prender a ideias demasiado rígidas. Deixar de lado os preconceitos... Libertar-me. Mas às vezes acho que atingi o outro extremo: ao tolerar tudo acho que já nada me surpreende.
Já há muito que uma música não me deixa emocionada.
Já há muito que não leio nada que me faça pensar, e que me obrigue à crítica.
Já há muito que ninguém me abala as estruturas como um terramoto.
Face a isto tento compensar, procuro desesperadamente estes sentimentos que não tenho: ouço tudo o que me aparece, de tal forma que não chego a prestar atenção a nada. Leio tudo o que encontro, e não me concentro na mensagem. Olho demasiado à minha volta à espera daquele alguém que me preencherá, e não o vejo.
Nesta ânsia de me descobrir na intensidade daquilo que sinto, daquilo que vejo e ouço, daquilo que me rodeia, não consigo focar-me em nada, e o mundo passa-me ao lado....
Sinto-me presa nesta bruma (que não ladra!) que me tolda os sentidos, e cada vez mergulho mais profundamente neste embotamento afectivo que me afasta da realidade. E cada vez menos me surpreendo, porque na realidade olho mas não vejo, só porque tento focar demasiado profundamente. Não me chega nada ao coração pelos ouvidos. E na realidade ninguém me consegue tocar....

E os óculos? Tinha pensado que queria uns mais "radicais", fora do convencional, mas olhaste e disseste que não: não te ficam bem. Não gosto. Demasiado masculinos. Horríveis. E logo me mostraste os outros, mais "clássicos", e esses sim, eram giros, e ficavam-me bem..... Será o hábito de me veres assim? E então fiquei baralhada, porque gostava dos dois, mas na verdade não sei para que lado escapar, porque se por um lado quero cortar com tudo o que me prende e sair em busca da liberdade, por outro assusto-me e penso: será que tens razão? Ou será que é apenas mais um hábito, que no fundo não tem fundamento?
Portanto deixo-me ficar neste limiar, nesta indefinição, nesta indecisão.

Não comprei nenhuns óculos....
A culpa não é tua, eu é que tenho que dar o passo em frente. Ou então encontrar a felicidade neste lugar em que estou.

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