quarta-feira, 16 de fevereiro de 2005

Tenho tido alguma dificuldade em escrever sobre este assunto.
As coisas definitivas intimidam-me e deixam-me sem palavras...

À tarde vou ter contigo. Hesito antes de escrever contigo, porque na maior parte do tempo já não estás ali. Passo o tempo a perscrutar cada milímetro da tua cara enrugada à procura de qualquer reacção às baboseiras que deixo sair num monólogo interminável, seja um esboço de um sorriso, seja um olhar mais atento, se tiveres os olhos abertos...
E vejo as pessoas à tua volta, a tentar agarrar-se a ti, como eu à procura de um sinal, de uma luz, de uma esperança para poderem dizer "Até amanhã, se Deus quiser!", como tu disseste a vida toda, com um sorriso que fica sempre só nos lábios.

Nestas alturas divido-me em duas: sou a tua neta e sou a outra, a do olhar frio, clínico, calculista, que avalia cada parâmetro que encontra, cada gesto, cada suspiro...

E este meu lado sabe que tu já não voltas mais, já chorou muito, mas só pede que o teu sofrimento acabe depressa, para poderes, enfim, descansar...
E se escrevo em letras pequenas é porque sei que a mim, em particular, me fica mal desejar isso, e não tenho coragem para o pronunciar em voz alta.